domingo, 7 de abril de 2013

Artista culto


ENVIADA PARA O PEDRO 
         Subindo a Consolação, me deparei com algo extremamente incomum. Um homem de roupas sujas, dentes pretos e barba feita me parou. Olhando para minha cabeça, falou “vocês estão na festa do bom saber, não?”.
         Estranhei. Quem é esse cara? O que ele quer comigo? Será que quer me matar? Ou será que quer me abraçar? Será que quer ser meu amigo? Ou inimigo? Quantos anos será que ele tem? Qual é a idade dele? Será que ele tem pai? Mãe? Irmão? Tio, avô?
         Mas logo entendi. Ele se referia a Pessach (páscoa judaica), pois olhava para o solidéu que eu estava usando.
         Começou então um desenrolar de idéias. Não sei como aquela conversa, que começou com o bom saber, foi parar em “quanto mais rico o pai da criança maior o ovo de chocolate que ela ganha, e mais legal é ela”. Desta frase fomos para no capitalismo e para as críticas a sociedade mal-humorada e “trabalhadora” dos motoristas que param no sinal.
         A conversa que havia começado na travessa da Rua Fernando de Albuquerque, acabou logo depois, na travessa da Rua Matias Aires com a Consolação.
         A conversa havia durado somente uma quadra, mas para mim aquilo tinha durado uma eternidade.
         Continuei meu caminho, mas não conseguia parar de pensar no tal homem culto. Será que ele virou meu amigo? Será que eu virei amigo dele? Queria tanto encontrá-lo de novo. Queria saber o que ele faz. Qual seria sua profissão? Ainda nem sei o nome dele. Bem que eu poderia passar o dia com ele. Ele é muito legal. Será que ele acha o mesmo de mim? Esta história daria uma boa crônica. Será que ele iria ficar incomodado se eu fizesse uma crônica sobre ele? Acho que não.
         Ainda no mesmo dia estava voltando para casa, descendo a Consolação, e me deparei novamente com ele... O tal senhor tão respeitoso, na verdade, era um ARTISTA de rua. Encontramos-nos, novamente, no sinal da Rua Matias Aires com a Consolação.
         O sinal estava fechado para os pedestres, então comecei a conversar com meu colega de ideias. Ele me disse que fazia o que gostava e não precisava de que os motoristas lhe oferecessem dinheiro e sim que os motoristas lhe oferecessem ATENÇÃO.
         O sinal abriu. O tal artista me pediu para ver seu show... Ele era um artista mesmo! Com dois paus ele se equilibrava e fazia manobras com uma tocha, com fogo nas duas pontas!
         Ao final do show ele tentou fazer com que os motoristas se animassem, mas nenhum sorriso brotou das bocas fechadas dos motoristas.
         O sinal se fechou e nada de sorrisos ou feixes de atenção... O artista se retirou do meio da rua e foi para a calçada. Nos despedimos, e nunca mais nos vimos...

Será mesmo que ele me achou legal?
Ou eu era só um objeto de discussão para ele?
De qualquer jeito, eu arrumei um amigo...

Nenhum comentário:

Postar um comentário