terça-feira, 9 de abril de 2013

Chicleteiros Anônimos

ENVIADA PARA A LUANA
      Não há nada neste mundo mais triste que um chiclete em baixo da mesa. Aquilo gruda e não sai mais. O chiclete atrai nossa mão como um para raio atrai raios em uma noite de tempestade, ou como uma cortina atrai gatos, ou até mesmo como uma bola atrai um cachorro.
Fico imaginando que tipo de pessoa coloca um chiclete em baixo da mesa. Gordos? Altos? Magros? Feios? Feias? Preguiçosos? Trabalhadores? Grosseiros? Homens? Mulheres? Velhos? Crianças? Adultos? Adolescentes? Comunistas? Tontos? Ignorantes? Burros? Idiotas? Bonitos? Loiros? Morenos? Chineses? Americanos? Franceses? Portugueses? Insistentes? Antenados? Capitalistas? Professores? Médicos? Economistas? Bombeiros?... Não sei bem que tipo de pessoa coloca chiclete em baixo da mesa. Mas de uma coisa eu sei, todas as pessoas que colocam chiclete em baixo da mesa tem várias vezes sua mãe @##$%#$!*&()&¨%#$.
         Imagino também como estas pessoas colocariam o chiclete. Se fosse uma adolescente que não ligava para a vida, ela simplesmente colocaria e pronto. Se fosse um pestinha diabólico, ele passaria meia hora pensando o lugar mais estratégico para colocar o chiclete e alguém melecar a mão. Se fosse um senhor respeitoso e certinho, pedindo perdão á deus, ele disfarçaria o máximo possível e colocaria o chiclete, pois não tinha mais opção. Não sei bem se quem coloca o chiclete tem boas ou más intenções, só sei que nós, que colocamos a mão no chiclete, não recebemos este presente de tão bom grado.
         Não sei você, mas eu nunca coloquei e nem vou colocar um chiclete em baixo de uma mesa.
         Colaborem com a ONG CCCA (Contra os Colocadores de Chiclete Anônimos).
         “Mas será mesmo que a culpa de nossas vidas serem tão melequentas é de nossos compatriotas, os Chicleteiros Anônimos?” 

domingo, 7 de abril de 2013

Artista culto


ENVIADA PARA O PEDRO 
         Subindo a Consolação, me deparei com algo extremamente incomum. Um homem de roupas sujas, dentes pretos e barba feita me parou. Olhando para minha cabeça, falou “vocês estão na festa do bom saber, não?”.
         Estranhei. Quem é esse cara? O que ele quer comigo? Será que quer me matar? Ou será que quer me abraçar? Será que quer ser meu amigo? Ou inimigo? Quantos anos será que ele tem? Qual é a idade dele? Será que ele tem pai? Mãe? Irmão? Tio, avô?
         Mas logo entendi. Ele se referia a Pessach (páscoa judaica), pois olhava para o solidéu que eu estava usando.
         Começou então um desenrolar de idéias. Não sei como aquela conversa, que começou com o bom saber, foi parar em “quanto mais rico o pai da criança maior o ovo de chocolate que ela ganha, e mais legal é ela”. Desta frase fomos para no capitalismo e para as críticas a sociedade mal-humorada e “trabalhadora” dos motoristas que param no sinal.
         A conversa que havia começado na travessa da Rua Fernando de Albuquerque, acabou logo depois, na travessa da Rua Matias Aires com a Consolação.
         A conversa havia durado somente uma quadra, mas para mim aquilo tinha durado uma eternidade.
         Continuei meu caminho, mas não conseguia parar de pensar no tal homem culto. Será que ele virou meu amigo? Será que eu virei amigo dele? Queria tanto encontrá-lo de novo. Queria saber o que ele faz. Qual seria sua profissão? Ainda nem sei o nome dele. Bem que eu poderia passar o dia com ele. Ele é muito legal. Será que ele acha o mesmo de mim? Esta história daria uma boa crônica. Será que ele iria ficar incomodado se eu fizesse uma crônica sobre ele? Acho que não.
         Ainda no mesmo dia estava voltando para casa, descendo a Consolação, e me deparei novamente com ele... O tal senhor tão respeitoso, na verdade, era um ARTISTA de rua. Encontramos-nos, novamente, no sinal da Rua Matias Aires com a Consolação.
         O sinal estava fechado para os pedestres, então comecei a conversar com meu colega de ideias. Ele me disse que fazia o que gostava e não precisava de que os motoristas lhe oferecessem dinheiro e sim que os motoristas lhe oferecessem ATENÇÃO.
         O sinal abriu. O tal artista me pediu para ver seu show... Ele era um artista mesmo! Com dois paus ele se equilibrava e fazia manobras com uma tocha, com fogo nas duas pontas!
         Ao final do show ele tentou fazer com que os motoristas se animassem, mas nenhum sorriso brotou das bocas fechadas dos motoristas.
         O sinal se fechou e nada de sorrisos ou feixes de atenção... O artista se retirou do meio da rua e foi para a calçada. Nos despedimos, e nunca mais nos vimos...

Será mesmo que ele me achou legal?
Ou eu era só um objeto de discussão para ele?
De qualquer jeito, eu arrumei um amigo...

Fantasia Traiçoeira


ENVIADA PARA O PEDRO
         Outro dia fui passar o fim de semana em um sítio em campinas...
         A casa era grande e as paredes avermelhadas refletiam e contrastavam com o brilho azulado da piscina cristalina. O verde das árvores ressaltava o orvalho reluzente que descia redondo pelas folhas da palmeira. Tudo continuava monótono, o sol já se escondia atrás das nuvens carregadas da mais pura das águas, da água da mágoa de Deus, que contrastavam com o monótono trabalho do Diabo. Mesmo com a obra do Diabo permanecendo na terra firme, a monotonia daquela cesta de vime me intrigou: em cima de uma pequena mesa a cesta de vime abraçava com todo carinho uma mexerica, um cacho de bananas e dois limões foscos.
         A mexerica, que brilhava feito uma estrela, me intrigou mais ainda. Não foi o fato da mexerica brilhar que me intrigou e sim o fato de que ela brilhava estranhamente, ela brilhava (não sei como) falsamente. Naquela hora o Doutor Hipóteses bateu na pequena porta de minha cabeça, eu abri, e, de repente ele começou a fazer uma bagunça, soltava ideias para todo o lado: Talvez fossem as gotículas de água, que se instalavam na pele espessa da casca, que brilhavam, pois refletiam a luz da lamparina. Talvez fosse uma mera ilusão. Talvez toda mexerica brilhasse daquele jeito. Talvez aquilo não fosse uma mexerica, e sim, um disco voador disfarçado, que não conseguia esconder o brilho por ser feito de metal... Nenhuma das ideias do Doutor Hipóteses me satisfez, então a Senhora Curiosidade teve que agir: ela pegou uma faca, e com muita rapidez, matou a Dona Preguiça.
         Forçado pela nova ditadora, Senhora Curiosidade, fui obrigado a me levantar e me dirigir a mexerica.
         Passei, levemente, o dedo por cima da tal mexerica brilhante, e então, senti...
         Senti a falsidade humana, a falsidade capitalista, a prova do capital instaurada até nos pensamentos mais distantes da grande metrópole...
         “Deus nos proporciona as suas lágrimas, enquanto o Diabo torna nossa existência uma monotonia capital, uma fantasia traiçoeira, que torna até os instantes mais verdadeiros em falsos”.

quinta-feira, 4 de abril de 2013

EPOPÉIA CACHORRONICA


ENVIADO PARA O PEDRO
 Eu, todo feliz, peguei as chaves do carro e fui para o portão, saí. Abri o porta malas do carro e peguei minha sunga. Estava fechando o porta malas, quando...
             Latidos ecoaram em minha cabeça. Rapidamente me virei, o cachorro estava fugindo. Por que eu havia deixado a porta aberta? Talvez por que a preguiça tenha me tomado? Pode ser que minha cabeça, que estava pensando na piscina cristalina, tenha se distraído e se esqueceu? Outra opção é que eu tivesse deixado a porta fechada, e como aquele pastor alemão era muito forte ele abriu a porta? Pode ser também que um disco voador queria me sacanear, então, os alienígenas abriram a porta que eu havia fechado... Não faz muita diferença o jeito como o cachorro escapou, pois agora a única coisa que tenho que fazer é capturá-lo.
             Rapidamente larguei as chaves dentro do porta malas e saí correndo atrás do grande pastor. O que será que aquele pastor queria? Será que dentro daquela cabeça coberta de pelo há uma mente que pensa como a nossa? Será que aquele pastor estava tirando sarro da minha cara? Será que ele só queria passear um pouco? Não sei o que ele pensava, mas de uma coisa eu tenho certeza: ele havia ficado irritadíssimo quando encontrou seus amigos cachorros, pois não parava de latir e rosnar para eles. Pode ser também que ele tenha ficado contente, pois, quem sabe, latidos e rosnados em cachorrês possam ser um cumprimento, uma declaração de amor ou um pedido de desculpas.
     Sempre, que o pastor fazia uma reclamação, ou quem sabe, uma declaração de amor, os outros cachorros, que esperavam ansiosos para uma oportunidade de falar, não esperavam um só instante. Logo respondiam, com latidos, as perguntas ou afirmações feitas pelo pastor. Às vezes respondiam agudo, às vezes rouco, às vezes firme e determinante, mas sempre respondiam com força e o mais alto que conseguiam.
     O que será que os cachorros conversavam? Falavam sobre manicure: “ontem fiz minha unha”, “de que cor?”, “eu pintei de obseCÃO”, “foi da marca CÃOpricho?”. Ou será que falavam sobre política: “em quem você votou, para presidente?”, “CÃOrlos, e você”, “CÃOrlos uma ova, claro que votei no CÃOcelcio”. Podiam também falar sobre culinária: “já ouviu falar sobre o mais novo prato na culinária?”, “não, qual é?”, “BaCÃOlhau com CÃOmarão”. Sobre algo estes cachorros falavam. Disto eu tenho certeza.
       Aquela caminhada já estava ficando cansativa, quando em fim, apareceu a salvação. Ao longe, avistei o dono do sitio, Waldemir, trazendo consigo a coleira do cachorro.
        Daí para frente tudo ocorreu bem.Ou melhor, quase tudo...
         Pegamos o cachorro pela a coleira e o levamos de volta ao sítio.
        Chegamos. Agora o cachorro estava em seu lugar e tudo estava certo. Onde foi mesmo que eu coloquei a chave do carro?
A epopéia continua, mas a história acaba aqui.
          Como diria Michael Ende “Mas essa é uma outra história e terá de ser contada em outra ocasião” (A História Sem Fim).



Oi, tudo bem?

ENVIADO PARA LUANA
          Oi.
          Olá.
          Tudo bem?
          Sim, e você?
          Sim, estou bem.
          Tchau!
          Até mais!
         Esta conversa monótona de elevador me intriga. Será que meu companheiro de elevador estava mesmo bem?
         Aquele senhor todo respeitoso de calça preta, paletó cinza, gravata bege e cara fechada não podia estar bem. Ele poderia ter brigado com a mulher, o seu cachorro poderia ter estraçalhado seu jornal, sua filha poderia estar brava com ele, sua casa poderia ter desabado, seu filho poderia ter sido reprovado em matemática na escola... Tudo poderia ter acontecido, e só no último do caso, ou talvez nunca, a verdade seria revelada.
         A boca seca que contrastava com seus olhos castanhos, expressava um tom de desconfiança.
      Será que aquele homem pensava o mesmo que eu? Será que ele também se intrigava com aquela conversa?
      Pode ser que ele pensasse: Aquele menino não está bem, ele pode ter sido reprovado em história, pode ter acabado de perder a namorada, pode ter acabado de perder seu dever na boca do seu cachorro, MAS A ÚNICA COISA QUE NÃO PODE TER ACONTECIDO A ESTE MENINO, É ELE ESTAR BEM!!!
        Se ambos pensamos do mesmo jeito, por que não mudamos a nossa monótona conversa de elevador para algo assim:
           Olá, tudo bem?
          Não, não está nada bem, meu periquito morreu, meu cachorro comeu minha lição, eu acabo de pisar no cocô e este chiclete não quer sair do meu pé, esta vida está um inferno, não?
          Claro... Minha mulher tá uma fera, minha filha não quer nem falar comigo, e, ainda por cima, meu filho foi reprovado em matemática, Tá difícil mesmo viver hoje em dia.
            Tchau!
            Até mais!
         Talvez, se os papos monótonos de elevador se tornassem assim, verdadeiros, não precisaríamos mais de psicólogos, pois desabafaríamos tudo no nosso parceiro de elevador. Para isso acontecer, no entanto, ou os elevadores teriam que ser mais lentos, ou, teríamos que incluir um curso intensivo de locutor de rádio e outro de paciência em todas as escolas do mundo.
         Mas enquanto o governo não toma iniciativa para a melhoria das nossas conversas de elevador, é melhor continuarmos com o monótono, falso e agradável:
 TUDO BEM?
 SIM, E VOCÊ?
 TUDO.
 TCHAU!
 ATÉ MAIS!



quarta-feira, 13 de março de 2013

EGO-FUMANTE



       ENVIADA PARA O PEDRO
    Não sou fumante, nem planejo ser, mas eu tenho uma raiva daquele fumante fresco. Aquele modo como segura o cigarro ou aquela vozinha irritante que soa a qualquer hora, como reclamação ou desprezo, até o jeito como se veste me incomoda.
Sabe, outro dia estava na área fumante de um restaurante ‘finíssimo’ e avistei o fumante fresco, com um terno azul, colarinho branco, meias pretas, um cabelo todo arrumadinho e um nariz empinado. Ele, sentado a duas mesas a minha frente, estava quase acabando seu almoço e prestes a pedir seu matinal cafezinho, mas antes se deliciava com uma salada de frutas de bananas ainda verdes que contrastavam com o vermelho chamativo do morango maduro.
        E então o inesperado aconteceu, algo detestável para o fumante fresco: o careca de terno preto, calça verde e gravata psicodélica, da mesa ao lado, acendeu um cigarro, o fumante fresco não quis nem saber e foi reclamar com seu colega, fumante, que havia desrespeitado a Lei dos Fumantes Fresco (LFF), pois esta lei diz: “enquanto um fumante fresco estiver comendo nunca se acende um cigarro”.
        Começou então o bafafá...
        Esse fumante fresco na verdade pode ser chamados de ego-fumante, pois quando é ele que vai fumar não importa quem e nem o que estejam fazendo do seu lado ele fuma e fuma o tempo que quiser, mas quando os outros vêm fumar na sua cara ele fica furioso no mínimo diz: @#$%&*%$#$%@!!!!!!! mas pode até acabar matando. O que será que o fumante fresco tem na cabeça? Será que ele nasceu na época do “geo-egocentrismo” e ainda não percebeu que as coisas mudaram, agora o sol que fica no centro do universo, não mais a terra, agora o povo fica no centro a sociedade, não mais você próprio, pode ser também que o fumante fresco nasceu com uma dislexia física que o impede de mover sua cabeça e não consegue parar de olhar para o seu umbigo, pode ser também que não seja culpa do fumante fresco, ele pode ter sofrido um trauma com cigarros e não consegue mais ficar perto de cigarros enquanto come, ainda mais, pode ter um problema sério com o pulmão e quando ingere alimentos a fumaça que entra no seu nariz e atrapalha sua digestão e além disso pode ser que ele tenha risco de morte, pois quando a fumaça do cigarro se encontra com o amido do alimento ingerido a reação química que o corpo dele produz é violenta e ele pode acabar morrendo... Quem sabe? Devemos ter pena ou raiva? Pode ser simplesmente uma frescura, mas também pode ser uma doença grave.
        Mas no final das contas nada faz diferença, pois o fumante fresco teve que se retirar do recinto esfumaçado...


domingo, 3 de março de 2013

Mundo Eletrônico


        Estou andando em direção a minha casa, passo então por um grupo de crianças amontoadas, elas se juntam em torno de um único objeto que mais parecia uma estrela, emitia uma luz própria.
        Se eu não me engano as crianças estavam em torno de um I pad (aqueles I não sei o que lá são todos iguais), elas jogavam um jogo estranho, elas não paravam de cutucar a tela, não sei como não manchava.
        A quilo me deixou estranhamente incomodado, não sabia porque, mas logo descobri... Aquelas crianças jogavam um jogo inútil que não ajudavam elas em nada, em vez de estudar ou se exercitar, coisa boa e útil de se fazer. Sei que estou sendo um pouco moralista e conservador demais, mas o que o jogo eletrônico traz para gente, nada, burrice, repetição...
        Certo, dizem que os eletrônicos vieram para ajudar (podemos aprender e pesquisar, muito mais fácil com eles), mas sempre junto com a ajuda vem a burrificação que “distrai” as crianças e ao mesmo tempo as tornam acostumadas a viver em um mundo aonde tudo vem pronto, principalmente a diversão, ou como os produtores preferem dizer pré-pronto.
         Será mesmo que este mundo eletrônico é tão ruim assim.
         Se ele não existisse, eu, nem você, estaríamos aqui.
      Ainda andando em direção as crianças decido falar com elas, mas elas nem me olham...